Para não dizer que não falei em sementes e sal. (Autor Ricardo de Faria Barros)

Nunca esqueço alguns almoços celebrativos de quando eu trabalhava na BBTS (BB Tecnologia e Serviços), nos quais saíamos tal qual uma manada esfomeada, e feliz, por ter acontecido algo legal no mundo do trabalho. E era preciso comemorar coletivamente aquele gol.
Nestas ocasiões, geralmente optávamos por um restaurante que ficava a uma travessia de nosso prédio, na 508 Norte, aqui em Brasília. Aprumávamos o faro em direção ao Xique-Xique, nosso vizinho de avenida, situado do lado de lá. Lá chegando eu pedia o meu prato predileto: carne de sol, com feijão de corda, e farofa d´água. Um prato de comer ajoelhado, de tão bom.

Lembrei que esse prato só foi possível, com o domínio da arte de semear e de salgar a carne, consideradas a maior revolução no modo de vida nômade da Humanidade, no seu processo de produção coletor-caçador, há 10.000 a.C e 2.000 a.C respectivamente.
Então, com o sal e as sementes a revolução se fez. O excesso de proteína animal, numa determinada época do ano, poderia ser guardada para tempos futuros, com o uso da salga. E as frutas, cereais, legumes, tubérculos e vargens podiam ser plantados, em períodos do ano mais favoráveis, criando com sua safra as condições necessárias para que o Homem finalmente se fixasse em algum lugar, e ali se estabelecesse como vivente, e não mais como sobrevivente - que migrava de lugar em lugar para coletar e caçar.
Entre uma garfada e outra, pensei em tudo que nos ocorre, em nossa saga de existir, que pode nos tirar dessa condição de nômades de nós mesmos, de eternos sobreviventes, e nos fixar como viventes. Tudo aquilo que pode nos ajudar a desfazer as malas emocionais e deitar sobre a terra alicerces bem fundamentados de coletividade.

Se para o Homem Neolítico, a revolução foi possível com o domínio das sementes e do sal, para o Homem da pós-modernidade, nesse Séc. XXI que mal estreia, a revolução se dará pelo domínio do cultivar de emoções positivas, e do salgar a vida com o sal dos valores.
Acredito que após nossa saga de mais de 12.000 anos, retornamos ao período pré-neolítico, e por aqui impera novamente o reinado dos nômades, com seus caçadores tecnológicos de modernidades líquidas e com os coletores de pequenas felicidades alheias.
Paradoxalmente, portanto, ainda faço parte do grupo dos que acredita que estamos no limiar de um transição disruptiva no estilo de vida da sociedade. Fruto do cultivar das emoções-pensamentos positivos; e no salgar dos valores universais. Expressos sempre em função da melhoria da vida do outro.

Como toda transição, quem está dentro dela nem sempre a vê, logo ali chegando, trazendo os tempos novos.
O povo do bem está se juntando, e em todo o mundo. É que estamos fartos de tanta violência e egoismo. Estamos cansados de tanta comunicação digital, que não comunica nada, pois só fala, e não escuta ninguém. Estamos cansados de tanta destruição na natureza, e despersonalização humana.
Queremos desfazer nossas malas comportamentais, e habitar num outro mundo possível.
Sim, eu sei, pode não ser coisa para esse século. Mas, virá esse dia!
Tivemos a revolução agrícola, a industrial, a tecnológica e a próxima será a comportamental.
Que não afetará o modo de produção, mas o modo de ser gente.

Nós nos perdemos como coletividade. É fato. Perdemos capital social e de humanização das instituições e trabalho. E andamos sentindo falta de algo, como o valor de trocar uma prosa, com as cadeiras na calçada da rua, ou de um abraço caloroso, para além das datas festivas.
E sentimos falta de algo, que em nossas lembranças mais ancestrais ainda mora, o valor do coletivo partilhado numa roda de fogueira, dentro de uma gruta quentinha e segura.
E é na consciência da falta que o desejo impera.
E, somos todos desejantes de tempos novos.
Eu vejo vir vindo os tempos de uma nova revolução.
Que passa pelo reeducar emocional do otimismo, da compaixão e da esperança participante; e pela práticas de valores da paz, gratidão, generosidade, honestidade e respeito.
Peguemos nossos alforjes e os enchamos com esse tipo de sal e sementes.
E, deixaremos de ser nômades de nós mesmos, sempre em busca de uma condição para ser mais feliz: um Se. Ou de um acontecimento: um Quando. Aprenderemos o valor do agora, com sua ação positiva nossa de cada dia, em ação positiva nossa de cada dia, um outro mundo está sendo erguido, silenciosamente, em gestos concretos que vão ecoar nos recantos do infinito.

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