Sobre banhos de cuia. (Autor Ricardo de Faria Barros)

Foto:http://www.sobreviveremsinop.com.br/2011/02/quem-toma-banho-ganha-mimos.html
Da varanda do apartamento que aluguei em João Pessoa-PB, para merecidas férias da aposentadoria, coleciono cenas cotidianas de fazer vibrar corações.
Dela, vejo o nascer do sol, e não me canso de me emocionar com ele.
Ali fico um tempão contemplando a beleza do humano, em movimento em direção à praia, com seus encantos mil, após estacionarem seus carros no terreno vazio de meu prédio. De onde observo-lhes, do quarto andar.
Uns carregam seus bebês no colo, carrinhos, ou “cacundas”, numa animação só. Como quem diz: “chegamos”!
Outros seus isopores com cerveja. Uns outros levam baldinhos, boias e assemelhados.
Em comum a todos a aventura de chegar no mar, trazendo a família, amigos, farofa e tralhas.
Profundamente humano esse comportamento social em direção ao prazer.
E, alguns prazeres pedem cabine dupla para melhor serem degustados.
Pedem a presença do outro. A praia pede isso. Assim como a feira livre, a praia é lugar de vinculação, de ajuntamento de gente bacana e ali constrói sua felicidade possível, e com o que tem, e como pode.

A cena que vi hoje, cegou meus olhos de tanta beleza. Voltavam da praia, pelas 11hrs, presumo que uma avó, sua filha e o neto, de uns 13 anos, já um rapazinho.

A mãe abriu os vidros de seu Fiat Uno, para esfriar o calor.

A vovó então, com uma garrafa de água que tinha deixado dentro do carro, lavou os pés da filha, para que ela não sujasse mais ainda o tapete.
E, economizando água, molhou os cabelos de seu neto, a face dele, suas costas e peito, tirando-lhe um pouco do sal.
Depois, repetiu o procedimento do lava pés, agora com o neto.
Aí olhou para o que sobrara de água, não muito, e passou sua própria saída de mar nos pés, já que não sobrara nada para ela.
Uauuuu!!!!
Aquele rapazinho, guardará nas memórias afetivas, e para o resto de sua vida, tanto amor que recebeu de sua vovó, naquele banho que talvez seja o que de melhor tomará na vida.
O banho do cuidado, do amor, do reconhecimento e da importância do outro. Um banho com gotas de água contadas, integralmente doadas ao outro. Na contabilidade do amor, acumula-se saldo positivo o amor que se doa. E, nesta manhã, a vovozinha faturou uma nota para seu saldo de bons momentos vividos, na expressão de ternura ao outro.

Eu queria ter tomado aquele banho hoje. Acho que tu também. Quem não quer, após sair do mar, e sob um sol daqueles de rachar taquara, receber água doce para tirar o sal e sol do couro. Bom e refrescante demais.

Mas, caros amigos (as), o que mais me chamou a atenção foi a expressão de felicidade do garoto, ao receber um banho de cuia. Ele soube ser grato e expressar gratidão com o que recebia.
Não foram gotas de água perdidas. Elas multiplicaram-se no coração da vovó, que logo resolveu seu pé sujo, com sua própria roupa, sem ficar triste ou receosa. Em casa lava.
Nesta manhã ela ensinou muito à própria filha e ao neto, a mim que observava, e a você que me ler agora.
Ensinou que quem ama não conta as gotas, não faz amor conta-gotas. Faz amor banho de cuia. Despudoradamente, bobamente, intensamente e sem medo de parecer ridículo. Quem ama se lambuza com momentos, tornando-os instantes mágicos, ao tocar-lhe com as mãos do infinito.
Enquanto recupero-me da cena, recebo no meu celular uma mensagem do Thiago Bispo, um amigo que fiz coaching de carreira no BB.
Ele me diz que antes de ir dormir, na noite de ontem, sentiu necessidade de entregar umas palavras para mim. Então, ao enviar o texto diz que agora cumpria o seu desejo. E me deu um verdadeiro banho de cuia emocional, com as palavras que me destinou.

Então, senti o quanto pequenas ações no cotidiano podem gerar um enorme frescor na alma, tal aquele que o rapazinho sentiu, tirando de seu corpo o sal que lhe queimava a pele.

Um gerente que reconhece seus liderados, está dando banho de cuia neles.

Um vizinho que coloca água nas plantas do vizinho, dá banho de cuia na vida dele.

Alguém que dá uma carona, ajuda num trabalho, visita um doente, um apenado, protege uma criança de olhos bovinos, defende os direitos de cidadania e ética, dá banho de cuias.
 
Todas as manhãs recebo meu banho de cuia, e em forma de bom dia, lindo dia, e olho para vida com o olhar de um menino que se diverte com sua vó dando-lhe banho, com a água de uma garrafa de 1,5 litros de água mineral. É tudo de que precisamos, um litro e meio de água, para banhos de esperança, e a cada dia.
E você pode ser esta água para alguém. Eu posso. E nós podemos.
É só não achar que o que temos é tão pouco para dar. Muitas das vezes, os melhores banhos, virão do tempo que destinamos para ouvir o outro, ou de abraços quentinhos, ou de uma pessoa que nos diga o que nem sempre é doce de ouvir, por nos amar e querer o nosso melhor.

Viva aos banhos de cuia!

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