Da Janela de Onde Salvo (Por Ricardo de Faria Barros)


Da janela de onde trabalha, ela postou a foto do jardim interno de sua empresa. Seguido de um comentário sobre o sentido de seu trabalho.
E, aquilo tirou meu sono da tarde. De radiante e feliz que fiquei. Como existem pessoas luz na humanidade!!
Em flashes de memória rebelde que tenho, evoco os anos de 1994-96, quando a vi, pela primeira vez.
Altiva, mas com medo, ela adentrou em meu grupo de Crisma pedindo uma vaga na turma, era a primeira reunião do grupo.
Ela tinha sido barrada, na inscrição tradicional, por não ter todos os pré-requisitos exigidos pelo "cartório de Deus".
Mas, decidida, meteu os peitos e se apresentou naquela manhã de domingo, na minha turma, dizendo que queria se crismar.
E a fé dela me tocou profundamente, e quem seria eu para barrar-lhe o ingresso naquela turma, mesmo sem dela fazer parte?
Lembro que comprei briga com os outros catequistas, que fizeram voto contrário, "para não abrir precedentes".
Para eles, ela deveria em primeiro lugar fazer o curso preparatório para a primeira comunhão. E, depois, só depois, fazer o de Crisma. Ou seja, já era!
Levei o caso ao padre, e ele gostou da ideia de mantê-la em minha turma.
Mas pediu que eu fosse falar com o Bispo, dado que o regulamento do Crisma é "mais em cima", e são os bispos quem crismam, na Igreja Católica.
Fui no Bispo, o saudoso Dom Luiz Gonzaga Fernandes e ele ficou emocionando, com tamanha fé daquela jovem. E aceitou crismá-la.
Voltei no domingo seguinte exultante, e ela apreensiva de levar um cartão vermelho. Então disse-lhe que ficasse tranquila, que ela não seria mandada embora de meu grupo, por não ter um dos requisitos exigidos pelos burocratas da fé, e que era muito bem-vinda!
A turma toda ficou emocionada e com ela festejaram.
Tempos depois, meu filho casou com sua sobrinha, a Andreza. E nossas famílias se juntaram, carnalmente falando.
Suzana hoje é cirurgiã-médica oncológica. Um ramo que por si só remete ao que temos de mais nobre na vida, o enfrentamento dela, em suas situações limites.
Ao ler esse post dela, abaixo transcrito, vejo Dom Luis sorrindo do Céu, de feliz pela postura dessa sua crismanda.
"Meu lugar de todos os dias....Hospital Napoleão Laureano. 🌹🍁🌳🌱
Dentre tantas especialidades médicas, às vezes me pergunto o porquê de eu estar na oncologia cirúrgica. E nela vivenciar sentimentos variados...me deparando com pacientes que lutam, outros se entregam, mas, todos veem no profissional a esperança da cura, do alívio da dor.
Todos os dias volto pra casa com várias lições, que vão bem além de um bisturi e de uma técnica cirúrgica....
E todos os dias eu me encontro mais com Deus, pois é na minha fé e na fé dos pacientes que tudo se renova.
Acredito que não terei a explicação de ter me encontrado numa área tão difícil em todos os sentidos. Mas, rogo a Deus que me capacite todos os dias, que me oriente, me instrua, me fortaleça, pois se serei um instrumento de Deus na vida de tantos. Que seja com amor, sabedoria e dedicação.
Evoluindo e aprendendo sempre. "
Sabe minha afilhada de Crisma, você nos tocou profundamente com esse seu amor pelo que faz, pelos seus pacientes, e pela luta pela vida.
Você poderia ser mais um dos tantos profissionais que vestem branco, ou qualquer outro tipo de farda, que vão ficando insensíveis ao sentido do seu trabalho.
Vão ficando cegos pela indiferença da rotina de todos os dias, os descrentes pela falta de recursos, ou ressentidos pelas agressões que recebem, inclusive de clientes, ou pelas ingratidões de quem nunca volta para agradecer, nem que seja com um abraço.
Aliás, gratidão é coisa que anda em falta, no Sec. XXI.
E é por uma imensa gratidão pelo que escreveu, que registro essas linhas, certo que em você se identificarão muitos profissionais que amam o que fazem, amam seus clientes e sabem que podem tornar a vida deles um pouco melhor, muitas das vezes apenas com um sorriso, ou uma palavra mansa.
Obrigado por existir! Suzana Correia, obrigado por existir!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seu comentário é uma honra.

Crônicas Anteriores