Na vida, aprenda a fazer risoto. (Por Ricardo de Faria Barros)


Você já fez ou viu alguém fazer um risoto? Tenho a felicidade de ter um filho “risoteiro”, o Rodrigo Barros, esse prato em suas mãos transforma-se num manjar, daqueles de rapar o tacho.
De tanto vê-lo fazer, fui aprendendo que o segredo do risoto é o caldo.
Você deve estar me perguntando, como assim?
É pessoal, o caldo no risoto é a alma do negócio.
Imagine que você pretenda fazer um risoto de camarão. Primeiro deve cozinhar os camarões, reservando o caldo, após seu preparo.
Então, com o caldo aquecido, você vai regulando o cozimento e o ponto do arroz, sem perder o sabor do camarão.
Se precisar de mais cozimento, para o arroz ficar ao dente, coloque caldo. Se a massa grudou num bolo grudento, com sintomas de brutalidade, de dureza, acresça o caldo para a ela voltar a ficar pastosa.
É uma arte, a colocação do caldo. Se colocar demais, fica tudo empapado e perder a elegância do prato. Se colocar de menos, ou não cozinha, ou esturrica tudo.
Se teve a coragem de me acompanhar até aqui, nesse texto, deve estar se perguntando e onde entram as emoções positivas nesse tal de risoto?
Nossos pensamentos operam como quem faz um risoto.
Os pensamentos negativos farejam problemas, atiçam nosso fogo da sobrevivência, dão ordens do tipo: ataque, se defenda ou fuja.
Eles nos ensinam sobre medos, riscos, desconfiança, perigos, ameaças e coisas do tipo.
Sua estrutura cerebral, o cérebro reptiliano, é ancestral, um sistema neurofuncional alicerçado nas profundezas de nosso cérebro, em áreas mais profundas do que as da emoções e razão: respectivamente o cérebro límbico e o Neocórtex .
Dito isso, voltemos para o risoto. O fogo que aquece a chapa é o cérebro reptiliano, o chef dos instintos de sobrevivência, ele é o pensamento instintivo com suas ordens: ataque, fuja, defenda-se!
Mas, uma vida regida só por ele seria muito infeliz. Ele é o fogo que nos alerta e nos faz sentir temores, alguns bem importantes, mas só ele não torna uma vida plena, um risoto bom.
Precisa-se do recheio. E quem nos dá o recheio de nosso risoto existencial é o Neocórtex. Com suas estruturas de lógica e razão. É Ele quem meio que coloca o arroz e o recheio de que será feito o risoto.
Por fim, entra o poderoso cérebro límbico, o caldo. É ele quem dá sabor à liga pastosa do risoto, entenda a metáfora. É ele quem fornece as emoções.
E, quanto melhor o caldo, mais positivas são essas emoções. Tem caldos ácidos, envelhecidos, que passaram do ponto, que estragam a comida, são as emoções negativas. Um bom risoto se faz com um caldo de emoções positivas.
Vou contar uma cena de meu dia para você perceber o risoto se formando. E as escolhas que tive que fazer para não deixar a massa ficar dura demais, ou mole demais, ao usar as emoções positivas com arte.
Fui pegar o carro da Cris na concessionária. Fazia um mês que esperávamos que chegasse o modelo escolhido. Hoje era tarde de festa. Com direito à foto dentro do carro e a emoção de sentir aquele cheirinho de carro novo, no mundo do consumo, um perfume inigualável.
Aí, na hora que ela entregou o carro dela, o antigo, como parte do pagamento, faltava um documento, e a transação não pode ser concluída, ficando para semana que vem.
Vamos lá agora ver o risoto do pensamento em ação.
No primeiro momento entra o fogo. Ele é instintivo. Esbravejei, disse que era um absurdo, que houvera uma falha gritante de comunicação. Ameacei até denuncia ao Procon.
Como aprendi a duras penas que não se faz risoto só com chama, deixei o cérebro Neocórtex agir. E a lógica e razão começaram a me fazer perguntas do tipo Socráticas: Eu poderia mudar a situação? Não. Tinha tempo hábil de conseguir a documentação faltante? Não.
A concessionária poderia receber o carro da Cris com documentação em falta e liberar o novo? Não. Ela poderia por ela mesma pegar a documentação? Não. No caso de transferência de estado o próprio cliente tem que ir no Detran. Minha braveza ajudaria em algo? Não.
A mocinha que atendeu estava arrependida de não ter dado a informação correta? Muito.
Ela poderia ser prejudicada no emprego. Sim. Eu posso ter me confundido nas orientações iniciais que ela me deu sobre transferência de veículo? Sim.
Ao fazer todas essas perguntas o risoto agora tem recheio.
Mas, ainda não é suficiente. Precisa do caldo da emoção positiva.
Aí ele entra.
Acalmando o coração. Tendo misericórdia com a vendedora. Dizendo para nós mesmos, o que serão mais alguns dias para quem já esperou trinta?
Por que tirar a paz de um final de semana com algo sobre o qual não temos o controle de mudar?
Por que estragar a noite, na qual receberemos amigos em casa? Por essa frustração e aborrecimento que passamos?
Eu até posso ver o caldo amolecendo a massa, o coração, diminuindo a intensidade do efeito do fogo sobre os grãos.
Esse caldo, o das emoções positivas é mágico, misterioso, transformador!
Mas, usá-lo é escolha. Nem demais, para não perdemos o senso de realidade, de luta, de saber se defender, atacar ou fugir, quando necessário, nem de menos, para irmos ficando totalmente movidos por pensamentos negativos que quando descem pelo rio de nossa vida, transformam o mais belo dos jardins em terra arrasada.
Viver bem é a arte de colocar o caldo no riso de nosso coração, e um caldo bacana, de emoções positivas do tipo: misericórdia, perdão, paz, bondade, mansidão, doação, empatia e amor. Esse caldo tem sabor e sustança!
Têm outros no mercado, mas só vão aumentar o aperreio e tirarão de uma vez sabor do prato de seu viver: são a vingança; a inveja; o ódio; os ressentimentos; as mágoas, a ingratidão e a indiferença ao amor. Todos também habitam o cérebro límbico, são emoções, só que elas destroem o valor das coisas, das relações e das novas possibilidades.
Então, caro amigo, quando a chapa de seu risoto estiver perdendo o controle emocional, de tanto calor que está botando nos acontecimentos, quem sabe não é hora de botar um pouco de caldo, dos bons e de sabor, para relativizar as coisas que lhe aconteceram, para olhá-las de outra perspectiva, para aprender a ter menos razões e justificativas para se sentir vítima e infeliz.
Assim como o segredo de um bom risoto é o caldo. O da vida boa, e pela qual se vale a pena viver, também. Mas, é outro tipo de caldo, é o o caldo bom e de sustança das emoções positivas.

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